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Curva ROC do Protocolo Qualidade de Vida em Voz Pediátrico (QVV-P)

RESUMO

Verificar a eficiência e determinar a nota de corte do instrumento Qualidade de Vida em Voz Pediátrico (QVV-P), bem como as medidas de sensibilidade, especificidade e eficiência. Participaram 230 voluntários, pais/responsáveis de crianças/adolescentes com e sem queixa vocal, de ambos os gêneros, com idade entre 2 e 18 anos, que responderam a versão brasileira validada do QVV-P, cujos três escores (geral, físico e socioemocional) foram analisados pela Receiver Operating Characteristic Curve (curva ROC). As notas de corte, a curva ROC e as medidas de especificidade, sensibilidade e eficiência variaram conforme o escore investigado - geral, físico ou socioemocional. O escore geral apresentou poder discriminatório excelente (eficiência=0,936; especificidade=0,991; e sensibilidade=0,881), o escore socioemocional teve classificação de rendimento razoável (eficiência=0,794; especificidade=0,604; e sensibilidade=0,983), e o escore físico foi um classificador excelente (eficiência=0,918; especificidade=0,946; sensibilidade=0,890). Foram determinadas as seguintes notas de corte e área sob a curva: escore geral- corte=96,25 e AUC=0,98; escore físico- corte=91,68 e AUC=0,97; e escore socioemocional- corte=96,87 e AUC=0,79. O protocolo QVV-P é um classificador excelente e eficiente na discriminação de crianças e adolescentes com e sem queixa vocal. A percepção dos pais/responsáveis quanto à presença de uma alteração na voz de seu filho possibilita a compreensão do comprometimento na qualidade de vida relacionada à voz, em 98% dos casos, principalmente, no que se refere às questões físicas do QVV-P.

Descritores:
Curva ROC; Qualidade de Vida; Criança; Adolescente; Questionários; Pais

ABSTRACT

To verify the efficiency and to determine the cutoff values that discriminate children/adolescents with and without vocal complaints, as well as the measures of sensibility, specificity and efficiency of the Brazilian Pediatric Voice-Related Quality-of-Life Survey (P-VRQOL). The participants included 230 parents of children/adolescents of both genders, aged between 2 years and 18 years, with and without vocal complaints that responded the validated Brazilian version of P-VRQOL. The three scores (total, physical and social-emotional) were analyzed by the Receiver Operating Characteristic Curve (ROC curve). The cutoff values, ROC curve and the measures of specificity, sensibility and efficiency varied as the score investigated - total, physical or social-emotional. The total score demonstrated excellent discrimination (efficiency=0.936; specificity=0.991; and sensibility=0.881); the social-emotional score was a reasonable indicator (efficiency=0.794; specificity=0.604; and sensibility=0.983) and the physical score was an excellent sorter (efficiency=0.918; specificity=0.946; and sensibility=0.890). The cutoff values and area under curve were: total score- cutoff=96.25 and AUC=0.98; physical score- cutoff=91.68 and AUC=0.97; social-emotional score cutoff=96.87 and AUC=0.79. The P-VRQOL is an excellent sorter to discriminate children/adolescents with and without vocal complaints. The perception of parents about the presence of vocal problem allows the judge of lower quality of life in 98% of the cases, especially, in P-VRQOL physical domain.

Keywords:
ROC Curve; Quality of Life; Child; Adolescent; Questionnaires; Parents

INTRODUÇÃO

Os protocolos de avaliação parental tem sido muito preconizados na clínica vocal pediátrica, pois a pouca idade do paciente pode inviabilizar a autoavaliação vocal(11 Verduyckt I, Remacle M, Jamart J, Benderitter C, Morsomme D. Voice-related complaints in the pediatric population. J Voice. 2011;25(3):373-80. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2009.11.008. PMid:20359863.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2009....
). Dentre os procedimentos de avaliação parental, destaca-se o de qualidade de vida relacionada à voz, que possibilita o melhor direcionamento das condutas terapêuticas(22 Gasparini G, Behlau M. Quality of Life: Validation of the Brazilian Version of the Voice-Related Quality of Life (V-RQOL) Measure. J Voice. 2009;23(1):76-81. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2007.04.005. PMid:17628396.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2007....

3 Ribeiro LL, Paula KM, Behlau M. Voice-related quality of life in the pediatric population: validation of the Brazilian version of the Pediatric Voice-Related Quality-of Life survey. CoDAS. 2014;26(1):87-95. [online] PMid:24714864.
-44 Connor NP, Cohen SB, Theis SM, Thibeault SL, Heatley DG, Bless DM. Attitudes of children with dysphonia. J Voice. 2008;22(2):197-209. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2006.09.005. PMid:17512168.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2006....
).

O Protocolo Qualidade de Vida em Voz Pediátrico (QVV-P) com validação brasileira(33 Ribeiro LL, Paula KM, Behlau M. Voice-related quality of life in the pediatric population: validation of the Brazilian version of the Pediatric Voice-Related Quality-of Life survey. CoDAS. 2014;26(1):87-95. [online] PMid:24714864.) permite aos pais mensurarem o impacto de um problema vocal na qualidade de vida de seus filhos(55 Boseley ME, Cunningham MJ, Volk MS, Hartnick CJ. Validation of the Pediatric Voice-Related Quality-of-Life Survey. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2006;132(7):717-20. http://dx.doi.org/10.1001/archotol.132.7.717. PMid:16847178.
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) de forma sensível e confiável; ele tem 10 questões afirmativas (4 do domínio socioemocional da qualidade de vida e 6 da esfera física) com aplicação entre 2 e 18 anos(55 Boseley ME, Cunningham MJ, Volk MS, Hartnick CJ. Validation of the Pediatric Voice-Related Quality-of-Life Survey. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2006;132(7):717-20. http://dx.doi.org/10.1001/archotol.132.7.717. PMid:16847178.
http://dx.doi.org/10.1001/archotol.132.7...
). Em relação às medidas psicométricas de validade do QVV-P(33 Ribeiro LL, Paula KM, Behlau M. Voice-related quality of life in the pediatric population: validation of the Brazilian version of the Pediatric Voice-Related Quality-of Life survey. CoDAS. 2014;26(1):87-95. [online] PMid:24714864.) e considerando-se o uso cada vez mais frequente, objetivou-se determinar os pontos de corte do instrumento e as medidas de sensibilidade, especificidade e eficiência.

MÉTODOS

Aprovado pelo Comitê de Ética (027/11). Participaram 230 pais de crianças/adolescentes com e sem queixa vocal, de ambos os gêneros, com idade entre 2 e 18 anos; todos assinaram o termo de consentimento. A coleta ocorreu em clínica-escola de fonoaudiologia, escolas particular e pública e consultórios de otorrinolaringologia. A caracterização clínica dos participantes está na Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização das crianças/adolescentes com e sem queixa vocal

Os escores do QVV-P foram analisados pela Receiver Operating Characteristic (curva ROC) que possibilitou a determinação da nota de corte pela combinação matemática de maior especificidade e sensibilidade, a verificação da eficiência, da sensibilidade e especificidade, permitindo a classificação de crianças e adolescentes com e sem queixa vocal pela definição da área sob a curva (area under curve – AUC).

A curva ROC é um instrumento binário com cinco graus de classificação: excelente (0,9 a 1), bom (0,8 a 0,9), razoável (0,7 a 0,8), pobre (de 0,6 a 0,7), e não discriminador (0,5 a 0,6)(66 Tape TG. Interpreting diagnostic tests [Internet]. Omaha: University of Nebraska Medical Center; 2015 [citado em 2015 Jun 9]. Disponível em: http://gim.unmc.edu/dxtests/Default.htm
http://gim.unmc.edu/dxtests/Default.htm...
). Os dados de sensibilidade traduziram o número de verdadeiros positivos, identificados pelo QVV-P, em relação a todos os positivos que preencheram o instrumento. Já os dados de especificidade refletiram quadros de falso positivo em relação a todos os negativos.

RESULTADOS

Os grupos com e sem queixa de alteração vocal foram semelhantes quanto ao sexo (p=0,231) e idade (p=0,874). As notas de corte, a AUC, especificidade, sensibilidade e eficácia variaram conforme o escore investigado. O escore geral apresentou nota de corte de 96,25, área sob a curva excelente, especificidade excelente, boa sensibilidade, e eficiência excelente. O domínio socioemocional, teve nota de corte de 96,87, AUC razoável, sensibilidade excelente, especificidade pobre e eficiência razoável. Já o domínio físico obteve nota de corte de 91,68 e área sob a curva excelente, com boa sensibilidade, excelentes especificidade e eficiência - vide Tabela 2.

Tabela 2
Valor de corte, Área sob a Curva, Sensibilidade, Especificidade e Eficiência do Protocolo QVV-P

DISCUSSÃO

Os dados da curva ROC do escore geral demonstraram que os pais/responsáveis, ao reconhecerem o problema vocal do filho, também percebem o impacto na qualidade de vida, em 98% dos casos. Além disso, pode-se afirmar que o QVV-P separa indivíduos com e sem queixa vocal, mesmo sem o diagnóstico de disfonia; o que o configura como excelente instrumento de triagem, avaliação e acompanhamento vocal.

A especificidade excelente demonstrou que o QVV-P só aponta prejuízo na qualidade de vida quanto à queixa de problema vocal; e a sensibilidade boa indicou que indivíduos com queixa podem não ser detectados, o que reforça a importância do cruzamento da autoavaliação, avaliação fonoaudiológica e laringológica para o correto diagnóstico da disfonia. Já a eficiência excelente assegurou que o QVV-P mensura com fidedignidade aquilo a que se propõe, sendo uma ferramenta de fácil administração e breve aplicação(55 Boseley ME, Cunningham MJ, Volk MS, Hartnick CJ. Validation of the Pediatric Voice-Related Quality-of-Life Survey. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2006;132(7):717-20. http://dx.doi.org/10.1001/archotol.132.7.717. PMid:16847178.
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).

Se os pais/responsáveis reconhecem que em duas das 10 questões do protocolo há um problema, mesmo que pequeno (valor 2 na escala de likert do QVV-P), isso é indicativo de uma possível alteração na voz da criança/adolescente, uma vez que o escore geral ficará abaixo da nota de corte do instrumento; o que reforça o fato de o QVV-P ser um protocolo objetivo centralizado na voz com excelente especificidade e eficiência.

Analisando-se especificamente os domínios do QVV-P, pode-se constatar que o socioemocional foi fraco na diferenciação de indivíduos, pois a AUC foi razoável, demonstrando que ele não é um parâmetro forte para a detecção de alterações vocais. Além disso, a sensibilidade excelente acompanhada de especificidade pobre e eficiência razoável, demonstrou que, embora ele seja sensível à queixa vocal, não é específico à uma alteração de voz.

O domínio físico, por sua vez, demonstrou melhores dados com excelente AUC, boa sensibilidade e excelentes especificidade e eficiência. Assim, embora nem sempre as crianças/adolescentes com queixa vocal sejam identificadas por esse domínio, ele só reconhece prejuízo na qualidade de vida mediante um problema vocal; é portanto a esfera mais específica e robusta do QVV-P.

Os três escores do protocolo podem ser levados em consideração. Entretanto, recomenda-se atenção às particularidades acima apontadas; deve-se analisar, primeiramente, os resultados do escore geral, seguidos do escore físico e do socioemocional. Para ações de triagem vocal, recomenda-se, inicialmente, o uso do escore geral para critério de passa ou falha, uma vez que, apresenta excelentes especificidade e eficiência.

CONCLUSÃO

O QVV-P é um instrumento de avaliação parental eficiente e confiável, com poder discriminatório excelente, que pode ser utilizado em ações de triagem à reavaliação, mesmo que o indivíduo não tenha o diagnóstico de disfonia. A percepção dos pais quanto à presença de uma alteração na voz de seu filho possibilita a compreensão do prejuízo na qualidade de vida, em 98% dos casos, especialmente sob a ótica dos aspectos físicos.

  • Trabalho realizado na Universidade Federal do Espírito Santo – UFES - Vitória (ES), Brasil.
  • Fonte de financiamento: nada a declarar.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Verduyckt I, Remacle M, Jamart J, Benderitter C, Morsomme D. Voice-related complaints in the pediatric population. J Voice. 2011;25(3):373-80. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2009.11.008 PMid:20359863.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2009.11.008
  • 2
    Gasparini G, Behlau M. Quality of Life: Validation of the Brazilian Version of the Voice-Related Quality of Life (V-RQOL) Measure. J Voice. 2009;23(1):76-81. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2007.04.005 PMid:17628396.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2007.04.005
  • 3
    Ribeiro LL, Paula KM, Behlau M. Voice-related quality of life in the pediatric population: validation of the Brazilian version of the Pediatric Voice-Related Quality-of Life survey. CoDAS. 2014;26(1):87-95. [online] PMid:24714864.
  • 4
    Connor NP, Cohen SB, Theis SM, Thibeault SL, Heatley DG, Bless DM. Attitudes of children with dysphonia. J Voice. 2008;22(2):197-209. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2006.09.005 PMid:17512168.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2006.09.005
  • 5
    Boseley ME, Cunningham MJ, Volk MS, Hartnick CJ. Validation of the Pediatric Voice-Related Quality-of-Life Survey. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2006;132(7):717-20. http://dx.doi.org/10.1001/archotol.132.7.717 PMid:16847178.
    » http://dx.doi.org/10.1001/archotol.132.7.717
  • 6
    Tape TG. Interpreting diagnostic tests [Internet]. Omaha: University of Nebraska Medical Center; 2015 [citado em 2015 Jun 9]. Disponível em: http://gim.unmc.edu/dxtests/Default.htm
    » http://gim.unmc.edu/dxtests/Default.htm

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Maio 2016
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    24 Abr 2015
  • Aceito
    16 Ago 2015
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